quinta-feira, 1 de novembro de 2007

O Decrescimento sustentável (parte II)


Um exemplo : a energia

Mais de três quartos dos recursos energéticos que utilizamos hoje em dia são de origem fóssil. Estes são o gás, o petróleo, o urânio, o carvão. São recursos não renováveis, ou mais exactamente com uma taxa de renovação extremamente baixa. De qualquer forma, sem qualquer relação com uso actual. A economia sã impõe-nos que paremos esta pilhagem. Devemos reservar estes recursos preciosos para usos vitais. Ainda por cima, a combustão destes recursos fosseis desagrega a atmosfera (efeito de estufa e outras poluições). Quanto ao nuclear, além dos perigos nas instalações, produz detritos com vida infinita à escala humana (plutónio 239, semi-vida 24 400 anos, Iodo 129, semi-vida 16 milhões de anos). O princípio da responsabilidade, que define a idade adulta, diz-nos que não devemos desenvolver uma técnica que não controlamos. Não devemos deixar aos nossos descendentes um planeta envenenado até ao final dos tempos.
Por outro lado, temos direito as energias «de rendimento», ou seja, a solar, a eólica, e, em parte, a biomassa (madeira) e um pouco da hidráulica. As duas últimas devem repartir-se com outros usos que não apenas a produção de energia.
Este objectivo só é atingível graças a uma redução drástica do nosso consumo energético. Numa economia sã, a energia fóssil desaparece. Será reservada a usos de sobrevivência como os medicais. Os transportes aéreos, os veículos a motor de propulsão estarão condenados a desaparecer. Eles devem ser substituídos pelos barcos à vela, a bicicleta, o comboio, a tracção animal (apenas quando a alimentação dos animais for sustentável). Bem entendido, toda a nossa civilização será transformada por esta mudança na relação com a energia. Isto significa o fim das grandes superfícies de comércio com a valorização dos comércios locais e dos mercados, o fim dos produtos artesanais importados ao desbarato dando lugar aos objectos fabricados localmente, o fim das embalagens de deitar fora para passarmos a usar recipientes reutilizáveis, o fim da agricultura intensiva motorizada valorizando assim a agricultura camponesa extensiva. O frigorífico será substituído por um quarto frio, a viagem as Antilhas por voltas de bicicleta no Alentejo, o aspirador pela vassoura, a alimentação carnívora por uma quase vegetariana, etc. Pelo menos durante o período de reorganização da nossa sociedade, a perda da energia fóssil levará a m aumento significativo do trabalho nos países ocidentais, e mesmo considerando uma redução grande do consumo. Não só deixaremos de ter a energia fóssil, mas também a mão-de-obra barata dos países de terceiro mundo não estará disponível. Nós teremos de recorrer à nossa energia muscular

Um modelo económico alternativo (1)

À escala do estado, uma economia sã gerada democraticamente não poderá ser outra que o fruto de uma procura de equilíbrio constante entre as escolhas colectivas e as individuais. Ela necessita de um controlo democrático da economia pelo político e pelas escolhas de consumo dos indivíduos. Uma economia de mercado controlada pelo político e pelo consumidor. Um não podendo se esquecer do outro. Sucintamente, podemos imaginar um modelo económico que se articula a 3 níveis:
• O primeiro seria uma economia de mercado controlada que evite todos os fenómenos de concentração. Seria, por exemplo, o fim do sistema de franchising. Todos os artesãos ou comerciantes seriam proprietários das suas ferramentas de trabalho e não poderiam possuir mais de que isso. Este seriam os únicos a decidir os actos da sua actividade, em relação directa com a sua clientela. Esta economia de pequenas entidades, para além do seu carácter humanista, tem o mérito de não criar publicidade, o que é uma condição sine qua non para a realização do decrescimento sustentável.
• O segundo nível, a produção de equipamento necessitando um investimento, existiria um capital misto privado e público, controlado pelos políticos.
• Por fim, o terceiro nível. Seriam os serviços públicos de base, não privatizáveis (acesso à água, à energia disponível, à educação e à cultura, aos transportes públicos, à saúde, à segurança).
Nós teremos de recorrer à nossa energia muscular.

A inserção de um tal modelo levará a um comércio justo para todos. Esta regra simples levará ao fim da escravidão do neocolonialismo.

Um desafio aos “ricos”

Ao anunciar as medidas a tomar para entrarmos em decrescimento sustentável, a maioria dos cidadãos ficará incrédula. A realidade é demasiado cruel para ser admitida, pelo menos para a maior parte da opinião pública. Ela suscita, na maioria dos casos uma reacção de animosidade. É difícil questionar-se quando se foi criado pelo biberão mediático publicitário da sociedade de consumo. Um cocktail estranhamente parecido com o Soma, droga euforizante descrita por Aldous Huxley no “Admirável mundo novo” (Brave New World, 1932, que anunciava um poder psicobiológico!). O mundo intelectual, demasiado ocupado a resolver algumas querelas bizantinas ou embebido pela ciência, terá também dificuldade em admitir que passou ao lado de um desafio da civilização tão importante. É difícil para os ocidentais imaginar um outro modo de vida. Pior, não podemos esquecer que o problema não se põe da mesma forma para a imensa maioria dos habitantes do globo. 80% dos humanos vivem sem automóvel, sem frigorífico ou ainda, sem telefone. 94% dos humano nunca apanharam o avião. Devemos, então, sair da nossa posição de habitante dos países ricos para percepcionar o mundo à escala planetária e imaginar a humanidade como uma e indivisível. Sem isso, seremos levados a pensar como Marie-Antoinette na véspera da revolução francesa, incapaz de imaginar deslocar-se sem a sua cadeira transportada por criados e oferecendo brioches aos que não tinham pão.

Fazer dieta

Cerca de um terço da população americana é obesa. Os americanos lançaram-se na pesquisa do gene da obesidade para resolver este problema de forma científica. A boa solução é certamente adoptar uma dieta mais saudável. Este comportamento é perfeitamente sintomático da nossa civilização. Antes de pôr em causa o nosso modo de vida, procuramos uma fuga na ciência, através de soluções técnicas, parar resolver os nossos problemas culturais. Ainda por cima esta fuga não faz mais que acelerar o movimento destrutivo. De facto, mesmo que o decrescimento nos possa parecer impossível, a barreira está sobretudo nas nossas cabeças que em dificuldades reais de o pôr em prática. Sair da opinião de um condicionamento ideológico fundado na crença na ciência, no novo, no progresso, no consumo, no crescimento condiciona esta evolução. A prioridade em empenar-se à escala individual na simplicidade voluntária. É a mudança em nós mesmos que transformará o mundo.

Definir um conceito

Se formos à definição do “desenvolvimento sustentável”, quer dizer: «ao que permite responder às necessidades das gerações actuais, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de responder às suas necessidades», então o termo apropriado para os países ricos é o “decrescimento sustentável”.

Bruno Clémentin e Vincent Cheynet

(La decroissance soutenable - http://www.decroissance.org/index.php?chemin=textes/decroisoute)

(1) Nota do tradutor/ editor do blog- existem diversos modelos económicos alternativos propostos dentro da ideologia do decrescimento, não estando o editor deste blog inteiramente de acordo com o aqui proposto. Outros exemlos serão publicados futuramente.

Um comentário:

Armindo disse...

o rescimento infinto leva-ns à destruiçao.